domingo, 14 de outubro de 2007

Citas II: Machado de Assís

El oficio depurado y la cultura impecable que aparecen en la obra de Machado de Assís, así como en la de Borges, son como el músculo explosivo y los pulmones inagotables del deportista genial: Sirven para apartar prolijamente las dificultades técnicas y permitirnos admirar la inteligencia humana en su forma más pura.

``A minha alegria quando ele nasceu não sei dizê-la; nunca a tive igual, nem creio que a possa haver idêntica, ou que de longe ou de perto se pareça com ela. Foi uma vertigem e uma loucura. Não cantava na rua por natural vergonha, nem em casa para não afligir Capitu convalescente. Também não caía, porque há um deus para os pais novos. Fora, vivia com o espírito no menino; em casa, com os olhos, a observá-lo, mirá-lo, a perguntar-lhe donde vinha, e por que é que eu estava tão inteiramente nele, e várias outras tolices sem palavras, mas pensadas ou deliradas a cada instante. Talvez perdi algumas causas no foro por descuido.''

``Príamo julga-se o mais infeliz dos homens, por beijar a mão daquele que lhe matou o filho. Homero é que relata isto, e é um bom autor, não obstante contá-lo em verso, mas há narrações exatas em verso, e até mau verso. Compara tu a situação de Príamo com a minha; eu acabava de louvar as virtudes do homem que recebera, defunto, aqueles olhos... É impossível que algum Homero não tirasse da minha situação muito melhor efeito, ou quando menos igual. Nem digas que nos faltam Homeros, pela causa apontada em Camões; não, senhor, faltam-nos, é certo, mas é porque os Príamos procuram a sombra e o silêncio. As lágrimas, se as têm, são enxugadas atrás da porta, para que as caras apareçam limpas e serenas, os discursos são antes de alegria que de melancolia, e tudo passa como se Aquiles não matasse Heitor.''

Português: Sobre o acordo ortográfico da língua portuguesa

Quando eu era criança, o mes de ``Septiembre'' passou a chamar-se ``Setiembre''. Essa mudança pode parecer menor para um acadêmico, para um professor universitário, noentanto para a criança que eu era constituiu uma crise de grandes dimensões. O porquê daquela importância exagerada não veio de minha preocupação pelas despesas das bibliotecas das escolas para a renovação de seus textos. Ela também não veio de imaginar as corruptelas por trás daquela mudança, nem perdi o sono por ter que modificar não só a grafia de uma palavra familiar mas também a sua pronúncia. Minha crise começou, e ela ainda persiste, quando notei que, embora minha professora escrevesse sempre ``Setiembre'', meus pais continuavam datando seus cheques em ``Septiembre'' e os bancos oficiais não encontravam nenhum problema em aceitá-los. Naquele preciso momento eu comecei a sentir-me imerso em uma esquizofrenia social crônica. Minha curiosidade levou-me a estudar quais ``Septiembres'' eram aceitos: Na prova de língua... nunca. Na prova de ciências sociais... quase nunca. Na prova de matemáticas... quase sempre...

Minha mãe, percebendo meu interesse obsessivo naquela questão, passou a escrever ``Setiembre'', mas já era tarde. Para uma criança, a língua é coisa séria. Mais séria que para um literato ou um acadêmico, sem dúvida, porque na infância a língua e o raciocínio crescem juntos como osso e carne. As crianças adoram as regras e odeiam as exceções, e sobretudo odeiam que as regras sem exceções sejam descumpridas!

Eu não sei como é ensinada a língua portuguesa nas escolas na época atual. Talvez não se fale de regras estritas, talvez a professora não coloque uma nota ruim por escrever ``baptismo'' (de fato, essa grafia é aceita pela Academia Brasileira de Letras!) ou por colocar alguns tremas a mais ou a menos. Se esse for o caso, se a política ortográfica das escolas tornou-se mais flexível nos últimos trinta anos, então o acordo pode resultar bom ou ruim, dependendo de se ele atingir seus objetivos ou não. Porém, se a principal conseqüencia do acordo vai simplesmente ser que as crianças apreendam regras supostamente rígidas que tudo mundo deveria cumprir e ninguém cumpre, então o prejuízio moral vai ser infinitamente maior do que qualquer benefício diplomático, jurídico, ou ambiental.

A modo de posdata talvez devo admitir que ainda escrevo ``Septiembre''... É mais ``chic'', não acha?