quinta-feira, 30 de julho de 2009

Moderno

"Então o minhocão que era um lobisomem famoso principiou tremelicando ciou rabo e virou cachorro-do-mato. Escancarou a goela desencantada e saiu da barriga dele uma borboleta azul. Era alma de homem presa no corpo do lobo por artes do Carrapatu dedonho que pára na gruta do Iporanga."

"E devorou todas as pencas. E as bananas eram a sombra leprosa do mano Jiguê. Macunaíma ia morrer. Então se lembrou de passar a doença nos outros pra não morrer sozinho. Pegou numa formiga saúva e esfregou bem ela na ferida do nariz, formiga já foi gente que nem nós e a saúva ficou leprosa. Então o herói agarrou a formiga jaguataci e fez o mesmo. Jaguataci ficou leprosa também. Então foi a vez da formiga aqueque devoradora de sementes e da formiga guiquém, da formiga tracuá e da formiga mumbuca bem preta, todas ficaram leprosas. Não tinha mais formigas em redor do herói sentado. Ele ficou com preguiça de estender o braço porque já estava moribundo. Esperou a visita da saúde, criou força e pegou no mosquito birigüi mordendo o joelho dele. Passou a doença no mosquito birigüi. Por isso que agora quando esse mosquito morde a gente, entra na pele, atravessa o corpo e sai do outro lado enquanto o furinho de entrada vira na bereva medonha chamada chaga-de-Bauru."

Macunaíma, Mário de Andrade, 1926.

"A mulher é uma coisa misteriosa que chora sem razão, muda a toda hora de desejos e de voz e nunca aceita os meus carinhos e fica impassível diante de minhas desventuras pessoais."

Memórias sentimentais de João Miramar, Oswald de Andrade, 1924.